Nova diretriz brasileira: pressão 120x80 não é mais “normal”


A pressão arterial 12/8 (120/80 mmHg) — antes considerada “normal limítrofe” — foi reclassificada como pré-hipertensão segundo a nova Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial de 2025. Essa mudança, lançada durante o 80.º Congresso Brasileiro de Cardiologia e assinada pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN) e Sociedade Brasileira de Hipertensão (SBH), representa um marco nas políticas de saúde cardiovascular no Brasil.
Para estudantes e profissionais de enfermagem, é essencial entender o que muda em diagnóstico, tratamento, prevenção, rotinas de cuidado e comunicação com pacientes. Neste artigo, vamos destrinchar o novo escopo da diretriz: o que caracteriza essa pré-hipertensão, quais são as novas metas, os fatores de risco, e o papel da enfermagem para tornar essa diretriz efetiva na prática clínica.
1. O que mudou: definição e faixas de pressão arterial
Agora, valores de pressão arterial entre 120-139 mmHg sistólica e/ou 80-89 mmHg diastólica (ou seja, “12 por 8 até 13,9 por 8,9”) são enquadrados como pré-hipertensão. Antes, essa faixa era considerada “normal limítrofe” ou “normal” sob determinados critérios, sem necessidade de intervenção médica intensiva. Outra mudança relevante: o novo alvo terapêutico para quem já tem hipertensão passa a ser uma pressão abaixo de 130/80 mmHg (<13/8) para todos os pacientes, independentemente de idade, gênero ou presença de comorbidades.
2. Justificativa científica e influência internacional
Essas mudanças acompanham uma tendência internacional, especialmente as diretrizes da Sociedade Europeia de Cardiologia, que já haviam redefinido a faixa de “pressão elevada” para incluir valores previamente considerados limítrofes. O objetivo é atuar de forma preventiva, evitando que casos de “pré-hipertensão” avancem silenciosamente para hipertensão estabelecida, com risco aumentado de complicações como infartos, AVCs, doença renal crônica, entre outras. A reclassificação também estima incorporar avaliação de risco cardiovascular global — ou seja, não basta aferir os números da pressão, mas avaliar obesidade, diabetes, dislipidemia, histórico familiar, dano a órgãos-alvo etc. Pacientes com risco elevado podem requerer intervenções mais precoces.
3. Implicações práticas: para quem, quando e como intervir
Para quem: adultos sem hipertensão diagnosticada previamente, que se enquadrem na faixa de 120-139/80-89 mmHg. Também relevante para pacientes com comorbidades (diabetes, doença renal, doença cardiovascular) ou história familiar forte. Gestantes com alterações de pressão devem ser observadas com critério.
Quando intervir: nas fases iniciais com abordagem não medicamentosa: estilo de vida, alimentação saudável, controle de peso, redução do sal, prática física regular, cessação do tabagismo, moderação de álcool. Em pacientes de alto risco ou quando mudanças no estilo de vida não forem suficientes, considerar medicação precoce.
Como medir: reforço da importância de medições fora do consultório — pressão medida em casa (MRPA) ou monitorização ambulatorial (MAPA) — para evitar fenômenos como hipertensão do jaleco branco ou mascarada, que podem distorcer o diagnóstico.
4. Papel da enfermagem na nova diretriz
A atuação de profissionais de enfermagem será determinante em múltiplos pontos:
Educação em saúde: orientar pacientes sobre a importância de aferir pressão regularmente, reconhecer valores que agora requerem maior atenção, e sobre mudanças de estilo de vida (alimentação, atividade física, controle de peso, sal, álcool etc.).
Monitoramento de pressão: conduzir medições de pressão arterial com técnica adequada (posição do corpo, tipo de aparelho, repetição), registrar medições domiciliares ou ambulatoriais, identificar padrões de elevação persistente, e encaminhar para avaliação médica quando necessário.
Avaliação de risco cardiovascular: auxiliar no levantamento de dados como presença de diabetes, obesidade, dislipidemia, história familiar, hábitos de vida, uso de medicamentos, além de monitorar danos a órgãos-alvo (por exemplo função renal, cardíaca).
Intervenções não farmacológicas: participar de programas e ações de promoção de saúde — grupos de atividade física, orientação nutricional, rastreio de pessoas com sobrepeso ou sedentarismo, suporte psicológico quando necessário — como estratégia de prevenção primária.
Gestão clínica: em ambiente hospitalar ou ambulatório, seguir protocolos atualizados da nova diretriz, registrar adequadamente os novos limites, adaptar planos de cuidado, acompanhar pacientes com pré-hipertensão para evitar progressão da doença, e assegurar adesão ao tratamento.
Comunicação com o paciente: explicar que “pré-hipertensão” não é “hipertensão diagnóstica” (ainda), mas sim um alerta — para que o paciente não fique ansioso, mas se motive a agir preventivamente.
5. Desafios para implementação no Brasil
Capilaridade e desigualdade de acesso: muitas regiões, especialmente zonas rurais ou periferias urbanas, têm dificuldade de acesso consistente a equipes de saúde, aparelhos de aferição confiáveis, consultas de acompanhamento e monitoramento domiciliar ou ambulatorial.
Recursos humanos e capacitação: enfermeiros, técnicos e agentes de saúde precisarão estar bem treinados nos novos critérios, nas técnicas de aferição e no aconselhamento de estilo de vida.
Adesão dos pacientes: para muitas pessoas, pressão “um pouco acima do ideal” não gera sintomas, o que pode levar a baixa percepção de risco, desmotivando mudanças de hábitos. A informação clara e interativa será fundamental.
Sobreamento do sistema de saúde: com a reclassificação de um grande número de pessoas para faixa de pré-hipertensão, haverá aumento na demanda por consultas, monitoramentos, intervenções preventivas – pressão nos postos de saúde, unidades básicas, ambulatórios.
Decisão de tratamento medicamentoso: definir quem, quando e quais medicamentos iniciar em pacientes de risco elevado exigirá protocolos claros, ética clínica, observação de tolerância, efeitos adversos, custo-benefício.
6. Exemplos práticos: aplicações em cenários de enfermagem
Na atenção primária: o enfermeiro de UBS (Unidade Básica de Saúde) identifica paciente com PA 130/85 mmHg em consulta de rotina; orienta mudanças no estilo de vida, sugere aferição domiciliar da pressão arterial por um período, registra os dados; se após 3-6 meses não houver melhora, encaminha para avaliação médica ou inicia acompanhamento mais próximo.
Na consulta de pré-natal: gestante com pressão de 125/80 mmHg, que antes era considerada aceitável, agora deve ser avaliada com cautela, investigando histórico de hipertensão gestacional, orientações dietéticas, controle de peso, e acompanhamento mais frequente para evitar complicações.
Hospitais e clínicas especializadas: protocolo institucional para aferição de pressão arterial no momento da admissão, acompanhamento ambulatorial pós-alta, planos individuais de controle da pressão que envolvem enfermagem, nutricionistas, cardiologistas.
7. Recomendações para estudantes/profissionais de enfermagem
Mantenha-se atualizado: leia a nova diretriz (SBC/SBN/SBH) na íntegra, participe de cursos de capacitação e oficinas sobre hipertensão.
Verifique a técnica de aferição de pressão: limpeza de manguito, tamanho adequado do braçilho, posição do paciente, repouso prévio, medir em situação estável.
Incentive a aferição domiciliar ou ambulatorial quando possível para confirmar diagnósticos.
Trabalhe em equipe multidisciplinar: nutrição, fisioterapia, psicologia, médicos; pois mudanças de estilo de vida necessitam apoio integral.
Avalie risco global do paciente, não apenas números de pressão: obesidade, sedentarismo, histórico familiar, doenças associadas.
Registre sistematicamente: dados de pressão, evolução, intervenções realizadas, resultados; essas informações ajudam a demonstrar impacto e ajustar estratégias.
Conclusão
A nova Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial de 2025 traz uma atualização importante: a pressão arterial de 120-80 mmHg, antes considerada “normal limítrofe”, passa a ser classificada como pré-hipertensão. Isso reflete uma mudança significativa de paradigma na prevenção cardiovascular, com metas mais rígidas, atenção mais precoce e ênfase em intervenções não farmacológicas, mas também medicamentosa em casos de risco elevado.
Para a enfermagem, esse é um momento de oportunidade: de protagonismo nos cuidados de prevenção, de educação em saúde, de monitoramento e de promoção de qualidade de vida. Os desafios são reais, mas os benefícios potenciais — redução de infartos, AVCs, doenças renais, aumento da expectativa e da qualidade de vida — tornam esse esforço imprescindível.
Referências
“Pressão de 12 por 8 é reclassificada como pré-hipertensão em nova diretriz”, Hoje Amazônia.
“Pressão de 12 por 8 é reclassificada como pré-hipertensão em nova norma”, CNN Brasil.
“Pressão 12 por 8 deixa de ser considerada normal e passa a ser pré-hipertensão no Brasil”, Portal do Holanda.
Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Sociedade Brasileira de Hipertensão (SBH) e Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN) — Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial 2025. (Documento oficial)
OMS / Organização Mundial da Saúde — dados gerais sobre hipertensão e prevenção cardiovascular.