Classificação de Risco na Triagem: Como Aplicar o Protocolo de Manchester


A triagem é uma das etapas mais críticas nos serviços de urgência e emergência. Com o objetivo de priorizar atendimentos conforme a gravidade clínica do paciente e otimizar o fluxo de atendimento, surgiu a necessidade de implantar sistemas objetivos de classificação de risco. Um dos mais utilizados é o Protocolo de Manchester, que padroniza a triagem com base em sinais, sintomas e tempo seguro de espera.
Este artigo apresenta um guia completo sobre o funcionamento do protocolo, suas categorias, exemplos práticos e o papel da enfermagem na sua aplicação.
O que é o Protocolo de Manchester?
O Protocolo de Manchester, também conhecido como Manchester Triage System (MTS), é um sistema de classificação de risco criado no Reino Unido e utilizado em diversos países, incluindo o Brasil. Ele foi desenvolvido por profissionais de saúde com o objetivo de organizar os atendimentos em unidades de pronto atendimento, emergências hospitalares e prontos-socorros.
Seu diferencial é o uso de fluxogramas clínicos padronizados, que orientam o profissional a avaliar sintomas, sinais vitais e outras informações do paciente, classificando-os em níveis de prioridade com base na urgência do atendimento necessário.
Como Funciona a Classificação?
O protocolo classifica os pacientes em cinco categorias de risco, cada uma representada por uma cor e um tempo máximo seguro para atendimento. Essas categorias são:
Vermelho: significa emergência, ou seja, o paciente deve ser atendido imediatamente, pois há risco iminente de morte. Exemplos incluem parada cardiorrespiratória, perda de consciência súbita ou hemorragias graves.
Laranja: corresponde a muito urgente, devendo o paciente ser atendido em até 10 minutos. Situações como dor intensa no peito, sinais de acidente vascular cerebral (AVC), ou crises epilépticas podem se enquadrar aqui.
Amarelo: representa urgência moderada, com tempo de espera recomendado de até 60 minutos. Casos como febre alta persistente, dor abdominal forte ou crises asmáticas leves podem ser classificados nessa cor.
Verde: indica pouca urgência, ou seja, o atendimento pode aguardar até 120 minutos sem risco clínico. Exemplos incluem dor de garganta, sintomas gripais leves ou dores musculares.
Azul: significa não urgente, permitindo um tempo de espera de até 240 minutos. São casos que não demandam intervenção imediata, como renovação de receita médica, pequenas lesões sem dor ou desconforto leve.
Esses tempos de espera são orientações baseadas na segurança clínica, mas podem variar conforme o estado do paciente e a dinâmica da unidade de saúde.
Como é feita a triagem?
A triagem com o Protocolo de Manchester é feita por enfermeiros treinados, que utilizam fluxogramas clínicos baseados na queixa principal do paciente. Ao todo, o protocolo conta com mais de 50 fluxogramas diferentes — por exemplo: dor torácica, dispneia, cefaleia, febre, vômito, convulsão, entre outros.
Cada fluxograma contém critérios discriminadores, que ajudam a definir a gravidade do caso. Esses critérios analisam:
Intensidade da dor
Localização dos sintomas
Duração
Presença de outros sinais (como palidez, confusão mental, convulsões, sangramentos)
Parâmetros vitais (frequência cardíaca, respiratória, temperatura, pressão arterial e saturação de oxigênio)
Após selecionar o fluxograma e identificar os discriminadores, o enfermeiro atribui a cor correspondente e o paciente é orientado sobre o tempo estimado de espera.
Exemplos Práticos
Caso 1:
Um paciente chega relatando dor torácica opressiva que irradia para o braço esquerdo, acompanhada de náuseas e sudorese. Ao aplicar o fluxograma de “dor torácica”, o discriminador indica uma condição de emergência. O paciente é, portanto, classificado como vermelho, devendo ser atendido imediatamente.
Caso 2:
Uma paciente apresenta febre de 38,5°C há três dias, com dor no corpo, mas sem sinais de alerta. A triagem aplica o fluxograma de “febre em adultos” e, considerando a estabilidade dos sinais vitais, a paciente pode ser classificada como verde, com atendimento previsto em até duas horas.
Caso 3:
Um paciente procura a unidade por uma entorse leve no tornozelo, sem sinais de fratura. Ao aplicar o fluxograma de “traumatismo de extremidade”, o profissional classifica o paciente como azul, por se tratar de um caso não urgente.
O Papel do Enfermeiro
O enfermeiro é o protagonista da aplicação do Protocolo de Manchester. Sua atuação vai além da classificação técnica: é ele quem acolhe, ouve, examina, interpreta e comunica ao paciente e à equipe sobre o risco identificado.
É fundamental que esse profissional esteja capacitado e atualizado, pois uma triagem inadequada pode atrasar o atendimento de pacientes graves ou sobrecarregar os profissionais com casos não urgentes em horários de pico.
O enfermeiro deve ainda manter uma postura humanizada, explicando ao paciente (e seus familiares) o porquê da classificação e o tempo estimado de espera, minimizando tensões e frustrações comuns nas salas de espera.
Benefícios do Protocolo
Promove equidade no atendimento, priorizando quem realmente precisa.
Ajuda a identificar rapidamente situações críticas.
Organiza o fluxo de pacientes de forma eficiente.
Reduz a mortalidade em serviços de emergência.
Traz credibilidade e transparência ao processo de triagem.
Limitações e Desafios
Apesar dos benefícios, o Protocolo de Manchester enfrenta alguns desafios:
Requer infraestrutura adequada, como salas específicas de triagem e prontuário eletrônico.
Demanda tempo e treinamento contínuo dos enfermeiros.
Pode haver resistência de pacientes e familiares que não compreendem o motivo da espera.
Nem sempre é fácil aplicar fluxogramas quando o paciente apresenta múltiplas queixas ou condições atípicas.
Por isso, a triagem exige não só conhecimento técnico, mas também empatia, escuta ativa e julgamento clínico sensível.
Considerações Finais
O Protocolo de Manchester é uma das ferramentas mais eficazes para a gestão de riscos em unidades de urgência. Quando aplicado corretamente, contribui para a segurança do paciente, melhora a organização do serviço e fortalece o papel da enfermagem como peça-chave no cuidado emergencial.
A adoção do sistema, porém, deve vir acompanhada de capacitação da equipe, infraestrutura adequada e uma cultura institucional voltada para a qualidade no atendimento. Além disso, é essencial que o protocolo seja utilizado de forma ética e humanizada, respeitando a individualidade de cada paciente.
Referências
Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização no Atendimento em Saúde.
Conselho Federal de Enfermagem – COFEN.
Grupo Brasileiro de Classificação de Risco – Protocolo de Manchester.
Fernandes, L. M. (2023). Triagem em Serviços de Urgência: Teoria e Prática. Editora Ciência Enfermagem.
Manual de Triagem com Base no Protocolo de Manchester – Hospital Municipal de Urgência.
Sociedade Brasileira de Atendimento Integrado ao Traumatizado (SBAIT).